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Lula e o trânsito 

Por J. Pedro Corrêa.

Como ficará o trânsito brasileiro sob o comando de Luiz Inácio Lula da Silva pela terceira vez? Embora seja  muito cedo para começar a especular sobre quem serão os escolhidos para comandar a área de trânsito a  partir de janeiro de 2023, não faz mal tecer comentários sobre o que podemos esperar do novo governo.

Alguns dos leitores mais antigos se lembrarão de que, quando Lula assumiu a presidência da República, em  2003, o mundo vivia o começo de uma mobilização mundial pela segurança no trânsito. Já em 2004 a  Organização Mundial da Saúde e o Banco Mundial produziram um relatório sobre a situação global do  trânsito expondo um quadro dramático de perdas que iam da morte anual de centenas de milhares de  vidas humanas às perdas materiais incalculáveis em razão dos chamados “acidentes de trânsito” e  convocavam dirigentes de todos os países a juntarem esforços para atenuar esta sangria inaceitável.

O então presidente Lula assinou um dos prefácios deste documento – “World report on road traffic injury  prevention” (Relatório Mundial sobre Prevenção de Lesões no Trânsito) -, descrevendo a situação mundial  como muito grave, dando conta de que o Brasil estava fazendo a sua parte, mencionando inclusive a  redução de 5.000 vidas humanas graças a “esforços consideráveis no desenvolvimento e implementação de  segurança viária, campanhas de educação e programas que enfatizem o envolvimento do cidadão”.

Antes, no início do seu primeiro mandato, Lula havia feito um golaço ao indicar o engenheiro Ailton  Brasiliense Pires para a direção geral do Denatran, o que significava uma esperança para o setor de trânsito  de que, enfim, a área estaria em mãos competentes e promissoras. Ailton assume com a promessa de  formular um plano de segurança no trânsito, dotando o país de um documento inédito, mas que nunca  tinha sido tentado, infelizmente.

A Política Nacional de Trânsito, a PNT, enfim, surge na resolução 166, de 15/09/2004, do Conselho Nacional  de Trânsito trazendo, além da radiografia do trânsito nacional, um plano de metas de redução de mortes e  feridos por acidentes até 2016, ou seja, um período de 12 anos. O país jamais tinha visto algo parecido.

O plano, contudo, apesar de aplaudido, não foi implantado, aparentemente por falta de apoio de quem  deveria subsidiá-lo. Na verdade, conhecemos bem este filme: exigimos ações, mas “esquecemos” de lhes  dar o devido suporte.

O fato de, sob a batuta de Lula, já termos tido uma política nacional de trânsito significa que, sim, somos  capazes de montar planos consistentes, mas precisamos de apoio básico para implementá-los. Neste  momento, estamos engatinhando com o PNATRANS, o Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no  Trânsito, da Senatran, que sucede ao Denatran. Trata-se de um trabalho ainda mais completo que a PNT  mas que, também, depende fundamentalmente de apoio de Brasília para poder sair dos gabinetes para  chegar aos frontes municipais, onde se trava a verdadeira batalha do trânsito. Como os municípios estão  sem recursos para investir em ações de prevenções de sinistros de trânsito, o mesmo acontecendo com os  estados, resta à União fazer os aportes adequados para que o plano vá adiante.

Até onde consigo enxergar, o Pnatrans só conseguiu sair do lugar logrando acordos (burocráticos) de  cooperação entre a Senatran, estados e alguns municípios. Até agora, não tomei conhecimento de ações concretas de campo que objetivassem claramente a redução de vítimas de sinistros, que certamente  ocorrerão quando recursos específicos forem liberados. Neste ponto, na minha visão, reside a grande  esperança do trânsito brasileiro nesta nova gestão do governo Lula: a abertura de linhas de investimentos  que permitam estados e municípios atuarem sobre os pontos basicos do Pnatrans, já exaustivamente  estudados por competente grupo de voluntários durante os últimos tempos.

A comunidade do trânsito sempre reclamou que o Governo Federal tem obrigação moral de  descontingenciar vários bilhões de reais, em favor do Denatran, hoje Senatran, bloqueados no orçamento  federal e que teriam sido bloqueados para que a União pudesse fazer frente a outros compromissos  “prioritários”. A liberação total destes recursos não viabiliza totalmente o Pnatrans mas já representaria um  avanço considerável, extraordinário e promissor.

Vejo o papel da comunidade do trânsito como importante para discutir e levar este debate à toda a  sociedade exigindo dos nossos representantes em todos os níveis de governo uma defesa clara do futuro  do nosso trânsito. Se nós não fizermos a nossa parte, quem o fará?

 

J. Pedro Corrêa é Consultor em programas de segurança no trânsito (jpedro@jpccommunication.com.br)

 

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Artigo publicado sob autorização do autor.

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