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Em experimento, benefícios do exercício em ciclistas superaram efeitos negativos da poluição
Por meio de simulações de corrida, em ambiente com entrada de ar controlada, pesquisa constatou que maior quantidade de poluentes não alterou desempenho esportivo e fisiológico dos ciclistas.
Autor: Júlio Bernardes
Arte: Ana Júlia Maciel
Testes realizados em ciclistas de São Paulo sugerem que os benefícios do exercício são capazes de superar os efeitos negativos da exposição à poluição nas ruas da cidade. As simulações foram realizadas por pesquisadores da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP em um ambiente fechado, tendo como base uma corrida contra o relógio, em que o ciclista precisa cumprir um percurso no menor tempo possível. O ar circulante foi controlado quanto à exposição ou não a gases provenientes de partículas poluidoras. A pesquisa constatou que a maior quantidade de poluentes não alterou o desempenho esportivo e fisiológico dos participantes. Esses resultados indicam que estar exposto à poluição pode não ser um fator limitante da atividade física.
O estudo é descrito no artigo Effects of air pollution exposure on inflammatory and endurance performance in recreationally trained cyclists adapted to traffic-related air pollution publicado no American Journal of Physiology em 1º de junho.
“Foram analisados dez ciclistas, classificados como recreacionalmente treinados com base em dados obtidos por um teste de consumo máximo de oxigênio (VO2). Cada um dos voluntários realizou cinco visitas ao laboratório”, relata ao Jornal da USP o educador físico e pesquisador André Casanova Silveira, que fez a pesquisa durante a produção de sua tese de doutorado na EEFE. “O teste contra o relógio foi realizado de forma simulada. Nós usamos um sistema onde a bicicleta do voluntário era acoplada a um rolo de ciclismo com um computador ligado a um programa que imitava um circuito com 50 voltas de um quilômetro (km).”
“O objetivo geral da pesquisa foi analisar se a poluição teria algum efeito prejudicial ao desempenho em uma atividade física predominantemente aeróbia de longa duração, no caso, uma corrida contra o relógio de 50 km, em ciclistas treinados e residentes na cidade de São Paulo”, aponta o pesquisador. “Por meio de colaboração com o professor Paulo Saldiva, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), tivemos acesso a um modelo experimental, um contêiner preparado com filtros capazes de impedir a entrada de gases e partículas, criando um ambiente controlado, inclusive de variáveis como temperatura e umidade relativa do ar. Nós avaliamos dois cenários, a poluição ‘real’ do local entrando no contêiner ou a condição filtrada, onde o sistema de filtros diminui a quantidade de poluentes que está entrando no ambiente”.
O contêiner estava localizado nas dependências da FMUSP, próximo à esquina entre a Rua Teodoro Sampaio e a Avenida Doutor Arnaldo, na Zona Oeste de São Paulo. Os poluentes neste ponto são principalmente oriundos do tráfego de veículos, cuja estimativa diária é de 83.941 carros, 9.936 veículos movidos a diesel (ônibus e caminhões de pequeno porte) e 808 motocicletas.
A pesquisa avaliou fatores fisiológicos, como a frequência cardíaca, pressão arterial e parâmetros sanguíneos (p02, pCO2, saturação de O2). “Também foi analisada a percepção subjetiva de esforço, a qual é regulada tanto por esses fatores fisiológicos como psicológicos, sendo um fator determinante para o desempenho esportivo. Além disso, analisamos os principais marcadores inflamatórios (IL-6, IL-10 e PCR) e o marcador de neuroplasticidade (BDNF)”, relata Silveira. “Os marcadores inflamatórios são substâncias produzidas por células do sistema imunológico em resposta a algum agressor do sistema. O BDNF é produzido, principalmente, por células do cérebro e é um fator induzido pelo exercício relacionado à melhora cognitiva, de memória e aprendizagem.
Benefício do exercício
Segundo o educador, algumas pesquisas têm sugerido que o aumento de BDNF induzido pelo exercício é suprimido em ambiente poluído. “Isso é contrário ao que observamos neste estudo”, explica. “No entanto, esses outros trabalhos não usaram pessoas treinadas e não tiveram um ambiente controlado para a realização dos experimentos.”
“Nossos principais achados no estudo demonstraram que os parâmetros relacionados ao desempenho esportivo, assim como os indicadores fisiológicos e inflamatórios, não foram alterados em pessoas treinadas durante a prática de exercício em ambiente com baixa qualidade de ar”, destaca o pesquisador. “No entanto, o ambiente poluído levou ao aumento de BDNF comparado ao ambiente limpo, o que poderia indicar que os efeitos benéficos do exercício podem ser evidenciados em pessoas treinadas mesmo expostas a uma baixa qualidade do ar.”
De acordo com Silveira, os resultados da pesquisa sugerem que a exposição à poluição atmosférica pode não ser um fator limitante ao desempenho de ciclistas que residem e treinam em ambientes poluídos. “Os dados na literatura analisando pessoas treinadas acostumadas a treinar em ambiente poluído são escassos”, afirma. “Entretanto, baseados em nosso estudo e em pesquisas com animais que conseguiram observar tanto o treinamento como a exposição a poluentes de forma controlada e crônica, parece que a longo prazo as adaptações benéficas promovidas pelo exercício conseguem se sobrepor aos efeitos deletérios acarretados pela poluição.”
O trabalho de Silveira foi orientado pelo professor Rômulo Bertuzzi, do Grupo de Estudos em Desempenho Aeróbio (Gedae) da EEFE, com participação do pesquisador Júlio Hasegawa. A pesquisa contou ainda com a colaboração dos professores Paulo Saldiva, Monique Matsuda e Monica Marquezini, da FMUSP, Adriano Eduardo Lima da Silva, da Universidade Federal Tecnológica do Paraná (UFTPR), Ramon Cruz, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Michael Kohele, da University of British Columbia, e Luisa Giles, da University of Fraiser Valley, British Columbia, ambas no Canadá.
Mais informações: e-mail andre.casasv@hotmail.com, com André Casanova Silveira
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Fonte: Jornal da USP